LUISA CUNHA & BRUCE NAUMAN: UMA PERFORMANCE E UMA CONVERSA

Luisa Cunha, 2010

Como o próprio título indica, Luisa Cunha & Bruce Nauman: Uma Performance e uma Conversa, de 2010, resume-se a um encontro cujas particularidades os visitantes têm conhecimento através de um texto espalhado pelos dois contentores industriais em que se desenrola o acontecimento.  Apesar do fornecimento da descrição de uma sinergia criativa incessante, as brutais massas empilhadas de metal dos contentores – com uma escala que impõe uma implacável distância – obstruem abruptamente a conexão com a conversa-performance decorrida no seu interior.  Paradoxalmente, a rudeza dos espaços de transporte de mercadorias oculta agora habitáculos acolhedores, mas que, para quem se encontra no exterior, permanecem numa penumbra a ser interrompida por pontuais e etéreas zonas de luz. O abrupto contraste entre o excesso de visibilidade dos contentores e a (quase) invisibilidade da conversa-performance corresponde ao hiato entre a materialidade do presente – hoje cingido ao campo objectual – e o regresso aos confins da memória, encarado como possibilidade de produção da génese do futuro, propriamente comunitário.

Se o público é levado a unir as personagens através da produção de uma atmosferização do interior e, como tal, a conferir-lhe um continuum espacial, trata-se de uma ilusão a ser desfeita pelo facto de cada protagonista ocupar o seu próprio compartimento, do mesmo modo que a sua comunicação é estabelecida através de dispositivos electrónicos. Se as acções desenvolvidas no interior parecem equivaler a uma génese do processo criativo e, inclusive, ter correspondências com um ritual iniciático, surgem numa dinâmica que conta sempre com prolongamentos protésicos que incitam à supressão do contacto corpóreo, pelo que a inclusão de interfaces entre os agentes da conversa fomenta uma ambiguidade entre os campos da ontologia e da tecnologia. Assim como os contentores industriais são selados com correias e cadeados e dos seus interiores ressoa apenas um silêncio monádico – tornando inócua a verificação de presenças humanas efectivas -, também os avatares que proliferam nas auto-estradas da informação existem, simultaneamente, em todo o lado e nenhures.

Fernando Ribeiro