TV’S BACK

Alexandre Estrela, 1995

No contexto da utilização do vídeo no trabalho de Alexandre Estrela, TV’s back, assume uma objectualidade singular. Mais do que o vídeo com criação de imagem, aqui ele parece contrariar a sua vocação, para a afirmação da materialidade do seu suporte, do seu veículo.
Mostrando no ecrã de uma televisão a parte de trás da própria televisão, esta televisão, este objecto em particular, já não poderá ser mais encarada como mero veículo para o vídeo. Paradoxalmente, é a imagem, não evocando outra realidade que não este objecto/televisão, que sublinha a sua materialidade.
Por outro lado, TV’s back enquanto “TV está de volta” parece sugerir o ressurgimento de algo que, há mais de cinco décadas, nunca deixou de ser a presença mais dominante nas nossas casas. Como é que pode fazer sentido dizer que a televisão está de volta se ela nunca nos deixou?
Assim, esta ideia de um regresso da televisão surge como extremamente perturbadora no próprio absurdo da afirmação. Ao mesmo tempo, pode criar um sentimento de que se está a afirmar uma presença que se teria fundido nas nossas vidas ao ponto da invisibilidade, ou antes, ao ponto da indistinção.
Ao afirmar a materialidade deste objecto, coisificando a televisão, afirma a sua presença. Mas TV’s back é, antes de tudo, literalmente, explicitamente, a parte de trás de uma televisão, desta televisão. E, assim, Alexandre Estrela parece comprimir para o mesmo plano a parte da frente e a parte de trás deste objecto. Se, por um lado, terá sublinhado a sua objectualidade, também, assim, parece desmaterializá-lo, volatilizá-lo, na anulação da sua tridimensionalidade.
Nos nossos lares, as televisões, muitas vezes ligadas independentemente de alguém estar a ver, funcionam como uma espécie de janela, como uma espécie remédio virtual a qualquer sentimento de claustrofobia, num alcance espacial, indeterminado, infinito, de elasticidade sempre variável, abertura espacial com que janela alguma poderia rivalizar.
Aqui, esta “TV de volta” que também é, desta forma, “a parte de trás de uma TV”, parece anular completamente esta qualidade da televisão, fechando-a sobre si mesma. Está de volta para se anular, ou está de volta para estar mesmo presente, para se mostrar, como de facto é, para desmascarar o embuste. Se não é o fim do mundo, será algo muito parecido.

 

António Olaio